domingo, 30 de agosto de 2015

Pare de procurar razões para ser infeliz. By Ricardo de Faria Barros



Hoje chegamos cedo para o treino do futebol. Era perto das 08h:40min. O treino começa pelas 09hrs. 


O local estava vazio, silencioso de sussurros humanos. É feriado nacional, dia da República, e os trabalhadores do local estão de folga.
João Gabriel (5) está impaciente no carro. Quer descer e ficar sozinho no campo. Eu, digo-lhe que talvez não haja treino, por causa do feriado.
Ele muda o humor. Fica irritadiço e murmura triste: “mais papai eu queria jogar”.
Com o coração apertado, fito-lhe os olhos e o repreendo:
“Pare de procurar razões para ficar infeliz, alegra teu coração, seja forte”.
Não sei se entendeu. Mas, parou a birra.
Passaram-se uns eternos minutos e o seu técnico chega. Não precisa nem dizer que ele saiu em disparada para abraça-lo. 
Ufa, vai ter treino.
Corta a cena e voltem comigo uns 30 minutos. 
Eu estava na feira do produtor do Jardim Botânico. Sentei pra prosear com dona Odete. Aquela de sábado passado que seu perfume me acompanhou até aqui, onde teclo, nessa área verde perto do campo onde JG treina.
Pois bem, hoje ela estava com a “pá virada”. 
Descarregou comigo um monte de ressentimento que sente de pessoas que lhes são próximas, na feira. Sobre as mesas delas que estão ficando sem espaço; sobre o toldo do vizinho que tirou a atenção do quiosque dela.
Hoje ela estava como JG. Procurando razões, motivos para ruminar pensamentos ruins. 
Pedi um outro café e falei-lhe que viver é uma arte. A arte de mesmo diante de reveses, pressões, ingratidões, ou todo tipo de desentendimento, não s deixar embrutecer. Virar um vinagre ácido, no lugar de um vinho suave – com o passar do tempo e com o acúmulo de cicatrizes na alma.
Pare de procurar razões para ficar triste. No lugar, dê respostas à vida. Mude, transforme a situação. Mude-se da situação, parta pra outra. Ou mude a si mesmo de como a situação te abateu, caso não possa fazer nada mais. Transforme-se você mesmo para acolher o amor, essa é a maior de todas as revoluções. 
Outro dia na aula contei uma metáfora de infelicidade. 
“Era uma vez uma aluna chamada Amélia que toda as vezes, após as aulas do professor Ricardim, chegava em casa querendo comentá-las com o marido. Ao chegar em casa, e puxar assunto, ele dizia que estava cansado e vendo o futebol. Que depois conversaria com ela. Quarta a quarta ela foi definhando. Ficando infeliz. As atividades que passava para casa, muitas delas podendo ser feitas em família, ela nem mais o convidava para juntos fazerem. 
Pronto, ela acabara de criar um modelo mental de pensamentos ruins, angustiantes, de desamor. Com ele, um padrão de comportamento. Se fechar. Se retirar da cena, emburrar e perder o viço.
De tanto repetir aquela mesma vivência, ela criou um ciclo de processamento rápido de situações semelhantes. Internalizou nela um hábito de infelicidade, sempre que chegava para falar de algo importante para alguém e este não lhe dava a devida atenção. Ela passou a reagir como fez com o marido. Retirava-se para o quarto, chorava, murmurava e perdia o resto da noite em autoflagelações: ele não me escuta; não me dá atenção; não me ama mais... devo ser muito sem valor para nãos ser notada. No outro dia, aqueles pensamentos acompanharam-na trânsito adentro, e foi o tema das conversas com as amigas no cafezinho no trabalho...
Não precisa nem dizer que aqueles pensamentos de não ser valorizada, ouvida, estimada melaram as cores, sons e sabores de seu dia. Tudo ficou sem graça."

Agora voltemos ao João Gabriel e à ordem que dei pra ele: pare de procurar razões para ser infeliz.
Seguindo esse caminho na metáfora anterior o que Amélia poderia fazer:
1. Mudar a si mesma. Ao reconhecer os limites de seu marido, nas quartas à noite perto das 23hrs, e estabelecer esse tipo de conversa em dia e horário mais eficaz. 
2. Mudar a situação. No lugar de chegar querendo espaço para o diálogo, atenção, ser notada e escutada; fazer pipoca e ir ver o resto do jogo ao lado do maridão. Interessando-se pelas coisas dele. Perguntando-lhe, entre um ataque e outro, como foi o seu dia. E, nos dias que se seguem ir conquistando paulatinamente a mudança que espera. Diminuindo a ansiedade de querer falar tudo do seu dia, e aproveitando as brechas de atenção para entre um gol e outro, falar de suas coisas. Recriar espaços de escuta, sem esticar a corda. A educação pelo amor é a mais poderosa das forças para a mudança. 
3. Mudar-se da Situação. Não criar espaços para novas infelicidades, reproduzindo essa mesma vivência. Valorizar outros aspectos no relacionamento que sejam legais. Curti o que sobra e que é bom. Não dá murro em ponta de faca. E, caso a coisa fique feia, procurarem como casal ajuda. Cursos em igrejas, terapias de casais, uma viagem de re-lua-de-mel.

O bem-estar pede razão. Inteligência para repreender pensamentos ruins, opressivos, fétidos e substituí-los por outras facetas da vida, mais belas, que acabam sendo contaminadas e despercebidas quando estamos no ciclo de ninguém-me-ama, culpa ou mágoa.

Pare de procurar razões para ser infeliz. Isso é como procurar defeito em carro velho. Vai achar e um monte.
Aprenda a preservar seu ninho interior, apesar dos furacões e tempestades. 
Aprenda a fechar janelas na sua vida. Fechar ciclos. 
Não deu. Pronto acabou, vire a página.
Ele não foi o que você esperava. Um cara te xingou em público. Outro te ferrou no trânsito. No trabalho, um traíra puxou teu tapete. Você não recebeu a promoção sonhada. Não veio aquele email agradecido. No dia do teu aniversário, alguém especial esqueceu de ti.
Pare de pensar essas coisas. PARE! PARE!
Não fique hiperreflexivo, remoendo, murmurando sobre coisas que te aconteceram e que não foram legais. Use meu algoritmo: mude a si mesmo diante da forma como se deixa abater por elas; mude a elas mesmas – caso possa; ou mude-se delas, fechando as janelas e virando as páginas desse seu viver. 
As pessoas são imperfeitas. Nem sempre têm a noção do quanto nos magoam com seus comportamentos. Portanto, casca grossa para viver é bem é necessário e fundamental.
Pare de procurar razões para ser infeliz, mesmo que elas sejam boas razões.
Pare de viver papel de vítima dos outros, das circunstancias e até de si mesmo.
De se cobrar tanto e de querer que todos funcionem como gostaria. Não funciona assim, sinto muito!
- Próximo sábado pode não haver treino, por motivo de chuva.
- Os vizinhos da Odete poderão continuar espaçosos.
- O maridão dela poderá continuar vendo o jogo nas quartas...
Mas, se no futuro poderá haver inquietações, prepare-se no presente para melhor lidar com elas.
Mais aceitação, tolerância, adaptabilidade, flexibilidade e valorização de um monte de coisas que em toda situação ainda tem de boa que acabamos por não vê-las mais, quando o sangue ferve.
Pare de murmurar, resmungar, nutrir rancores e pensamentos ruins sobre os outros, você ou as situações.
Isso é um veneno que matará tua alma, pouco a pouco.

sábado, 29 de agosto de 2015

Os Hábitos da Infelicidade - Introdução (por Ricardo de F. Barros)


A foto dessa reflexão ilustra bem o que iremos discutir, nos próximos dias.
Trata-se da construção da fundação de uma residência, de seu alicerce. As madeiras funcionam como moldes, fazendo uma espécie de caixa na qual o concreto será depositado, entre ferros.
Quando o concreto secar, elas serão retiradas, e o alicerce estará firme. Hábitos são assim, como essas formas de madeiras, são moldes que nos dão segurança, que nos capacitam à ação, perante uma situação que vivemos.
Ou seja, os hábitos moldam em nós padrões de comportamento, rotinas, manias, costumes que visam, no limite, simplificar, racionalizar ou padronizar nossa existência. São importantes resultados de aprendizados, pois sedimentam valores culturalmente e socialmente compartilhados.
Contudo, nem todos os hábitos são virtuosos, positivos e que levam ao crescimento. Existem hábitos entrópicos, que roubam energia, que contribuem para a involução do ser. Para o seu não desenvolvimento.
Pense no hábito de dormir até mais tarde, aprendido nas férias. Ao retorno ao trabalho ou estudos, este hábito precisará ser desaprendido, e logo. Assim como ele existem centenas de hábitos que precisamos desaprender, dando lugar a outros mais saudáveis e que elevem nosso ser, atualizando nossa existência.
A educação é o principal vetor de renovação de nossos hábitos.
Ela nos capacita ao aprendizado de rotinas que respondam melhor às mudanças de ambiente e contexto, fundamentais ao crescimento do ser, e a uma existência plena.
Identificar os hábitos ruins, negativos, que dificultam o crescimento do bem-estar é uma questão de saúde pública.

O que me levou a conversar contigo, sobre os sete hábitos para a infelicidade, foi um email que recebi de um amigo. Nele, o amigo pedia uma orientação para um padrão de comportamento que sentia que estava criando raízes nele: o da infelicidade.

Seja no trabalho, seja no casamento, seja na relação com os filhos, seja até na relação com os amigos.
Sempre estava sentindo-se em falta, ou que faltava-lhe algo para ser feliz.

Ele me revelou que sentia uma vontade danada de partir para um lugar distante e ali descansar.
Aí liguei para o amigo. Têm coisas que precisamos da voz, ou da pele, para melhor ponderá-las.

Soube então que o sentimento de infelicidade dele aumentava quando ele postava suas insatisfações, nas redes sociais, e um coro de descontentes, como ele, as endossava. Ampliando ainda mais as suas percepções de sofrer: com votos de apoio, curtidas e comentários na mesma linha.

Para piorar, ele passou a cobiçar as vidas dos "vizinhos de rede social", para os quais ele achava que a vida não tinha problemas. Não sabia ele que ali são vidas editadas, privilegiando na edição os bons momentos.

Naquele manhã, ele acordou muito cansado de si mesmo. Estava a ponto de estourar.  A gota d´água foi uma discussão boba com sua esposa, por conta de uma tarefa doméstica sempre adiada.

Ele me revelou que sentia uma vontade danada de partir para um lugar distante e ali descansar.
Lembrei-lhe do Salmista, que teve esse mesmo sentimento: " Ó quem me dera asas como de pomba! Então voaria, e estaria em descanso. Eis que fugiria para longe, e pernoitaria no deserto."  Salmos 55,6-7

Ter esses sentimentos é normal, em ocasiões da vida.  Mas, se não atacarmos o fluxo por onde eles correm, o da infelicidade, o quadro poderá se agravar derivando em depressões, ou, no extremo, em  suicídios ativos ou passivos de todos os tipos.

"Como assim o fluxo da infelicidade, Ricardim?"

Nossos sentimentos, ao longo de nossa história, vão aprendendo a correr como num leito de um rio.
A água são os pensamentos. O leito, nossos hábitos emocionais.
Não adianta querer ser feliz, conduzindo essa água pelo mesmo leito, que por anos foi esculpido na rocha de nosso ser.
Temos que mudar o leito do rio. E isso é lento, exige paciência, autocontrole, autoconhecimento e abertura ao novo. Lembro-lhe, o leito são as emoções, a água os pensamentos.
Os seja, alterar hábitos da vida exigirá um trabalho enorme.  Alterar hábitos de vida é alterar o fluxo, o leito.
Mas, garanto-lhe a mudança será da ordem de uma metanoia, uma mudança profunda, quando alteramos o fluxo, o leito.
Altere o curso do rio, remodelando a forma como habitualmente processa os pensamentos e emoções de tua vida.
Leve suas águas para outros leitos, menos pedregosos de si mesmo.

Desaprenda hábitos, ou padrões de comportamento que te conduzirão, com certeza, à infelicidade.

Como assim, Ricardim?

Amigo, durante anos somos treinados a esculpir o curso do rio de nossas emoções por leitos rochosos, pelos caminhos da infelicidade. Isto acabará por criar hábitos - hábitos são padrões de comportamento aprendidos.
Quem nos treina são as famílias, escolas, amigos, igrejas e trabalho.
Padrões de comportamento que se replicam em todas as áreas de nosso viver, mesmo que nos mudemos dela: casamento a casamento, amigo a amigo, trabalho a trabalho, cidade à cidade, etc à etc... tudo repete-se mais cedo ou mais tarde. Pois, a força do hábito não renova a existência dessas vivências, apenas as atualiza, com os mesmos padrões de comportamento do velho - o do já vivido.

Hábitos que vão criando as condições das pessoas ficarem sempre extremamente infelizes.
Falo "extremamente", pois um pouco de infelicidade é sinal, também, de saúde mental.

A tristeza eventual e em episódios de luto, e as dificuldades, fazem parte do pacote do viver, e temos que beber desse cálice.

Sem querer esvaziar o tema, enumerarei nos próximos posts, os sete hábitos para a infelicidade, que precisamos desaprender urgentemente, tal qual o exemplo do hábito de dormir até mais tarde, re-aprendido nas férias de alguns.

Conversar sobre esse tema, para mim, é uma questão de cidadania, de engajamento na busca de uma saúde coletiva de maior bem-estar.  Nos tempos atuais, testemunhamos uma epidemia de falta de sentido na vida - com multidões de homens-zumbis carregando os fardos de sua existência, cujos hábitos moldaram estilos de vida calcados fundamentalmente no ter, prazer e poder, levando-lhes à uma frustração de sentido.  Aprender novos hábitos de vida, ao desaprender os hábitos de morte, faz-se urgente e necessário ao bem viver. Trata-se de uma questão de saúde e de educação pública.